Uma das sensações mais esquisitas que experimento, na minha lida cotidiana com as pessoas, é uma forte angústia quando tenho que me confrontar com situações em que a disputa por um lugar superior fica evidente. Sinto-me verdadeiramente incompetente para disputar espaços, num enfrentamento direto. Nunca soube lidar bem com isso. Desde pequeno. Aliás, se fosse eu um animal pura e simplesmente que dependesse da competição para conseguir um lugar ao sol, creio que morreria à míngua, ou atravessado pela ferocidade de uma mandíbula dilacerante, sedenta por extirpar do mundo mais um empecilho ao brilho de seu pelo. Tenho plena consciência de que isto é algo muito comum e, até certo ponto, "natural" (no sentido estrito do termo). Entretanto, o que me causa espanto a mim mesmo, é essa sensação de angústia. Reveladora de uma dificuldade para enfrentar uma situação típica do mundo adulto.Mas, deixe-me desenvolver mais esta idéia.
Dentro deste universo específico da competição, em que ela se manifesta das mais variadas maneiras, a disputa pela detenção da "melhor", da "mais verdadeira", da "mais inusitada" informação é a que mais me incomoda. É acintoso como se quer mostrar um certo poder, diante da revelação do "último furo". É como se estivesse diante de um festival de manifestação de Egos em que o "ter o último carro", "ter o último music player", ter a "roupa da última moda", o da mais elegante ou sofisticada grife, enfim aquilo que tipicamente caracteriza a superficialidade no mundo do consumo real, fosse substituído pela "nobreza" da informação. Como se a detenção e a exibição do conhecimento fosse mais nobre do que a detenção e exibição dos sofisticados itens de consumo aludido: o carrão, a roupa, o equipamento eletrônico, a moda etc. É certo que, em se tratando de vida em coletividade, é praticamente inevitável esse mecanismo. A questão é que, para mim, isso poderia ser evitável pelo menos entre pessoas que valorizam aquilo que considero essencial nas coisas em si: o conhecimento pelo conhecimento; o afeto pelo afeto.
O engraçado é que consigo separar bem a sensação de incômodo (e eu busco sempre algo em mim quando "algo" exterior me incomoda) da pessoa - ou grupo de pessoas - que a provoca.
Ontem, senti isso com uma intensidade muito forte. O que, em tese, seria um prazer, acabou se tornando um angustiante exercício de mortificação e de tentativa de superar a angústia.
Por que será que mexe tanto comigo uma certa sensação de incompetência, de incapacidade, de limitações - cuja sensação sei perfeitamente que é infinitamente maior do que aquilo a que, na realidade, elas se referem. De qualquer modo, a sensação está ali e é como se a própria coisa (incompetência, de incapacidade, de limitações) existisse de fato.
Tenho tentado trabalhar estes fatos em minhas sessões de psicanálise. Mas ainda estou muito longe de compreendê-los e, mais ainda, de saber o quê realmente eles significam pra mim. Meu analista tem sido muito perspicaz e tem colocado alguns pontos interessantes. Mas estou longe de entender qual o real grau de densidade que esta questão possui: pode parecer uma simples fuga do enfrentamento (necessário) do outro a que nos submetemos cotidianamente (hipótese mais, digamos, evidente) ou pode realmente ser um questionamento mais profundo sobre a condição existencial do ser humano.
(interrompido por um telefonema e não mais retomado)
(Escrito originalmente em 07/04/2008, caída no esquecimento no campo oculto do blog, esta mensagem foi relida e publicada em 08/05/2009, com algumas correções (sem alterar o seu conteúdo original).
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