quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Eleições e violência: algumas perguntas ensaiando respostas

Recebi de uma aluna estas perguntas. Escrevi as resposta de forma bem rápida. 



- Por que os casos de violência aumentaram nessas eleições?

Analisar este fenômeno é algo complexo. Vários fatores precisam ser levados em consideração. Vou tentar fazer aqui algo impossível: falar de forma rápida. De antemão, vários aspectos ficarão de fora. 

Antes de mais nada, eu gostaria de fazer uma distinção entre violência simbólica e violência física, concreta. Embora tivéssemos casos aqui e acolá de eventuais agressões concretas, o que se viu neste pleito foi uma acentuada agressividade no discurso, principalmente nos meios virtuais. Isso faz muita diferença. Claro que, ao longo do processo, com o acirramento dos ânimos, tivemos sim alguns registros de agressões físicas. Mas o volume e intensidade não se comparam à agressividade cibernética. Muitos analistas, inclusive, de forma acertada na minha opinião, compararam estas eleições - exatamente por estas características - com um campeonato clássico de futebol entre times altamente rivais. Até certo ponto, uma agressividade faz parte do processo. 

Dito isto, um primeiro ponto importante é, sem dúvida, o fato de que esta é uma das eleições mais polarizadas que temos em anos. É muito comum as pessoas remeterem à eleição de 1989 como a última que conseguiu converter uma polarização tão acentuada. Ou seja, muito tempo. Isso, por si só, contribui para acirrar os ânimos. Embora sempre tenhamos registrado animosidades brandas entre os eleitores de vários partidos políticos, na minha percepção, a animosidade direcionada contra o PT por uma camada bem expandida de pessoas (eleitoras ou não; militantes ou não) nesta eleição foi mais forte. Não se trata de vitimizar o partido, pelo contrário. Entendo que o PT, neste aspecto, colheu um pouco dos frutos que plantou ao longo do período bem expandido de poder. Isso é parcialmente explicado pela crescente insatisfação frente aos casos de corrupção e a profunda sensação de impunidade trazida pelo julgamento do mensalão envolvendo lideranças tradicionais petistas: o julgamento demorou muito a acontecer, se prolongou exaustivamente com recursos infindáveis e muitas penas originalmente impostas foram revistas e abrandadas. Se o PT é um partido que tradicionalmente angaria antipatia principalmente por setores da classe média e classe média alta, esses desdobramentos do Mensalão serviram para aumentar ainda mais a sensação de uma certa "aversão" ao partido. Quando falo desta impunidade, estou falando de percepção e sensação; não de um fato consumado. O fato é que a agressividade dirigida ao PT revelava muito da indignação contra a própria impunidade. Afinal, estamos falando de um partido que se construiu sob o fundamento da luta pela ética, pela coisa pública, pela boa política. E não foi exatamente isso o que se viu, embora tenha sido um governo bem acertado sob vários aspectos. A essas agressões, correspondeu um movimento de agressão contra, principalmente, o partido oponente, o PSDB. Agressões estas que não necessariamente eram reativas, mas também provocativas. O fato é que acabou virando um jogo de agressividade mútua entre pessoas que assumiram uma posição nos dois lados da luta. 

Claro que é preciso levar em conta que por trás da agressividade também escondem-se diferenças e outras questões de ordem pessoal entre aqueles que trocavam farpas pelas mídias sociais. 

Soma-se a isso o fato de que é a primeira grande eleição polarizada com mídias sociais. Isso é altamente relevante. Veja, não é a primeira com mídias sociais, mas a primeira polarizada com  mídias sociais. Todos sabemos que o fenômeno das mídias sociais hipertrofia (exatamente pelo seu caráter virtual) aquilo que ocorre no mundo real. As pessoas discutem mais e acaloram-se. E onde há discussão acalorada, há um terreno fértil para agressividades. E isso foi transposto facilmente do virtual para o real. Alguns de forma bem pesada e forte; outros, de forma mais branda e leve. Mas aconteceu. 

Finalmente, eu seria mais cauteloso quando se fala de ódio nessas discussões, como se tem falado em demasia. Embora sim, ele esteja presente em muitos casos, em boa parte das discussões que vi era manifestação de raiva pura e simples. Irritação mesmo com o interlocutor. Isso não necessariamente caracteriza um ódio, que eu entendo como sendo algo mais sistêmico e sistemático. Enquanto a raiva é uma explosão momentânea, o ódio é mais estrutural (e às vezes estruturante) na personalidade de algumas pessoas. É claro que houve manifestações de ódio e intolerância, mas também muita raiva momentânea (ou irritação) e, assim que passado o momento (ou as eleições) ela se dissipou. 


- Por que a questão política acabou sendo levada para um lado tão pessoal pelos eleitores?
Não é a primeira vez que isso acontece na história do Brasil. Houve outros tempos, antes da ditadura, em que grandes polarizações políticas eram levadas também para as relações pessoais. Sobretudo aquelas envolvendo grandes personalidades (como o caso de Getúlio Vargas), por exemplo. As pessoas discutiam nos cafés, nos bares, em casa. A grande diferença, novamente insisto, é que estamos num cenário de mídias sociais que aumentam este fenômeno, expandindo seus efeitos. Por exemplo: se antes, você precisava de um encontro presencial para discutir política, com as mídias sociais isso acabou virando quase uma constante na vida das pessoas: várias horas por dia elas entravam, viam alguma postagem, e acabavam não resistindo em entrar numa discussão. Daí para a projeção do espaço privado e íntimo (amizades e família) foi um pulo fácil. Antes, o círculo era mais restrito e as repercussões das discussões quase que se circunscreviam à esfera íntima. Agora, este círculo ficou muito alastrado (quase universal). E, nesse processo, esferas acabam se misturando. E vamos nos lembrar que, em muitas discussões, não é o assunto que importa: mas o tipo de relação e histórico de tensões que tenho com o interlocutor. É assim que, como disse acima, diferenças pessoais aparecem sob a capa de diferenças políticas, por exemplo. 

Há um outro aspecto também que ouvi de muitos alunos: como muitas relações são superficiais, muitas pessoas acabaram por conhecer os seus "amigos" de forma mais profunda (o que pensam, quais são os seus valores etc.) por meio da discussão de suas posições frente as eleições. Isso é um outro aspecto relevante e que não pode ser menosprezado. 


- Essa é a primeira eleição em que a violência chega a esse nível?
Boa parte já respondi antes. Insisto na relativização da violência simbólica. Em parte é explicado também pela polarização acentuada. 


- Esse cenário já era esperado?
Creio que ninguém ousou prever este diagnóstico. Mesmo porque, lembremos também, até a morte de Eduardo Campos esta polarização tão acentuada não se colocava nem de longe no horizonte. Até aquela época, a discussão era se Dilma seria eleita no primeiro turno ou no segundo. Quase ninguém (a não ser as lideranças dos partidos disputantes) ousava negar esta perspectiva. Com a morte de Campos, houve uma reviravolta. A novidade foi a rápida subida de Aécio e um grande aumento da chamada alienação eleitoral (termo técnico utilizado para a somatória dos votos brancos, nulos e abstenções) que chegou a terceiro lugar (mais que a votação de Marina Silva). Esse reposicionamento do PSDB trouxe a velha polarização entre os dois principais partidos, mas agora com os agravantes descritos acima aumentados ainda mais por um cenário de estagnação econômica e mais um grande escândalo ainda sob investigação mas que, automaticamente, fez as pessoas resgatarem todo o debate envolvendo o Mensalão há não muito tempo. 









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Palavras Iniciais

Olá,

Bem vindo a um espaço que, antes de mais nada, é despretensioso. Ou melhor, se há alguma pretensão é a de exercitar a arte da escrita, refletindo livremente sobre fatos, idéias, cinema, filosofia enfim, tudo o que valer a pena pensar.

Como se não bastasse a exigência da profissão, eu mesmo me impus a necessidade de registrar meus pensamentos os quais, reconheço, considero valiosos pela única e exclusiva razão de serem meus, de representarem meu ponto de vista sobre as coisas. Nada mais. É, pois, nesse exato sentido que me refiro à ausência de pretensão. Quero apenas falar. Falar livremente. E se o transeunte cibernético que por aqui se aventurar sentir que vale a pena iniciar um diálogo a respeito das idéias apresentadas (as quais, já adianto, não serão tão aprofundadas), vou sentir que terá alguma utilidade para além da minha própria extravasão.

Apesar de relativamente antigo, eu me esqueci completamente da criação deste espaço. Nele havia deixado, oculto, um único texto que resolvi publicar mesmo estando inacabado. A ele retorno com o propósito de alimentá-lo com mais frequência, o que para mim será extremamente benéfico, inclusive do ponto de vista pessoal. Vou aproveitar para registrar outros escritos, feitos em outras épocas - pré-internáuticas ainda - que certamente revelarão um outro Fred (principalmente para aqueles que já me conhecem).

Espero que o leitor que por aqui passar possa encontrar alguns pontos sobre os quais pensar. E, se sua generosidade permitir, deixar a contribuição de suas opiniões e seus pensamentos a respeito do que encontrar registrado para, inclusive, provocar minha contrarreflexão.

Boa leitura e obrigado pela visita.
Fred

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